janeiro 21, 2016

Caixa de Pandora

Arrumando umas coisas velhas, achei uma caixa lotada de cartas, cartões e bilhetinhos a partir da década de 90.
De quem? Da minha família, do meu namorado, de alguns amigos..
Pense num rio de lágrimas.
Graças a Deus que de lá, com exceção do meu avô, todos estão vivos.
Chegou ao ponto de ser insuportável continuar lendo as coisas. As cartas eu pulei todas, impossível. Primeiro que demoraria horas e, principalmente, porque não me sinto em condições de enfrentar tantos sentimentos.
Tem toneladas de carinho, best wishes, e muitíssimo amor. Uma caixa recheada de amor.
E por que dói tanto?
Porque a maioria dessas coisas foi escrita antes da era virtual, quando era comum (e esperado) receber cartinhas pela correio (que delícia) e nesse tempo eu estava afogada em depressão, fazendo vestibular, começando a faculdade, completamente cega aos meus potenciais.
Hoje lendo eu vejo o quanto tive apoio e não vi. Não me deixei ver. Pior ainda, me sentia imensamente só.
Hoje lendo me lembro com que olhos eu lia tudo isso e uma voz me dizia que era exagero tudo de bom que diziam sobre mim e que o que desejavam eu não merecia.
Deus do Céu. Como a depressão atrapalhou minha vida. Tem períodos dessa fase que estão em branco na minha memória. Apenas dias que se passaram e não tenho lembrança.
Ontem estudando, comecei a sentir o real peso dos últimos dez anos onde não me atualizei, por n razões. Já tava doendo. Aí hoje abri essa caixa...
Coincidência? Acho que foi Deus mesmo. Precisava desse empurrão.
Fico pensando como essas cartas e afins me afetariam se eu as recebesse hoje. Imensamente! Como de fato me deram um ânimo, mas também um amargo na boca pelo que perdi. As chances sociais, profissionais, de passeios, de realizações. Os anos perdidos. Uma vida que não vivi. E principalmente uma convivência mais próxima ainda dessas pessoas que me mostraram tanto amor.
Sei que não fui indiferente a eles. Sempre deu amor, carinho, cuidei, ajudei. O problema foi sempre ter achado que não merecia o que eles davam. Que eu tinha que ser melhor, mais legal, mais desenrolada, mais inteligente, mais isso ou aquilo.
Até agora não sei medir o quão realista ou dramática estou sendo nesse momento.
O que eu realmente era?
Olhando daqui de 2016, vejo uma garota do bem, tímida, que não entendia as malícias dos outros, que sofria de morte por tirar notas baixas na faculdade sendo que isso era super normal, ainda mais vindo de um ensino deficiente de cidade pequena. Vejo uma adolescente que se via feia e gorda (nas fotos percebo que eu era linda). Vejo uma mocinha que tentava se encaixar nos padrões de outras pessoas e não falava pra ninguém suas dificuldades e assim sofria calada.
Olhando para 2016 eu vejo uma mulher, que não se sente mulher, mas também não é mais tão jovem. Que no fundo sabe que não é uma pessoa ruim, não deseja o mal a quase ninguém. Que só faz mal pra si mesma, e como faz mal.
Claro que de lá pra cá muitas coisas mudaram. Algumas melhoraram (auto estima, confiança, independência, financeiramente) e outras pioraram (basicamente a imagem física).
Tudo que sou hoje é fruto do que fui. Seja pro bem ou pro mal.
Posso mudar o passado? De jeito maneira.
Mas foi bom ter lido essas coisas. Meu pensamento agora é que não dá pra ler mais  hoje. Muitos pensamentos invadem minha alma. A cota de hoje já foi.
Meu medo é guardar essa caixa e só acha-la daqui muitos anos. Meu desejo é de, daqui um tempo, ler cada cartinha que não tive coragem, com cuidado. E isso tem que ser antes de alguém  morrer, porque se dói agora, vai doer infinitamente mais.
Morbidez? Não, realidade.
Quero ser diferente. Aprender a demonstrar mais meus sentimentos. Aprender a me amar, principalmente.
O que eu fiz de tão errado pra mim mesma? Porque eu não me mimo como desejo fazer aos outros?
Porque não me sinto merecedora?

respirando fuuuuuundo

Bom, será que todos aqueles potenciais que falavam eram só pra agradar? Acho que não. Botando tudo nas devidas proporções eu vejo agora o que viam antes, tentavam me mostrar e eu me recusava.
Eu sempre fui a CDF da sala, e dentro da minha timidez, era fisicamente ativa, inventiva, mentalmente inquieta, amorosa, uma boa filha/irmã/namorada. Desejava fazer cursos de mergulho, fotografia, jogar capoeira, aprender a dirigir onibus, outros idiomas, ter um aquário de caramujos, viajar o mundo todo...
Porque estou agora me sentindo pra trás? Atrasada na profissão, envelhecida no corpo, indisposta para a vida social, sem vaidade, sem ânimo para criar ou realizar o que quer que seja. Sempre esperando a vida começar.
Todos os problemas que tenho hoje foram criados por mim, direta ou indiretamente!! E o ponto inicial, crucial, foi a depressão que ficou anos sem ser tratada. Morando na capital, longe da família, e me afastando de todos, "conseguia" convencer a todos de que estava bem, apenas muito ocupada com os estudos.
Quem vai questionar? Quem vai insistir pra tirar alguém do estudo?
Fui muito competente em esconder meus sintomas. Só que isso não era consciente. Quer dizer, eu tinha consciência que não estava bem, mas achava que era fraqueza, cansaço, preguiça.. Bem típico da depressão. O paciente não sabe, geralmente alguém tem que dizer. no meu caso, foi uma professora que me alertou.
Por causa da depressão, fiz uma faculdade que poderia ter sido muitíssimo mais aproveitada. Na época eu só queria que acabasse, pensei em abandonar, cheguei a trancar. Agora gostaria de ter a chance de fazer tudo de novo, com a cabeça de hoje.
Só quando tranquei foi que comecei o tratamento, mesmo assim, sem medicação. Só terapia. Ainda não sabia 100% que era depressão. Olhando pra trás, vejo que se tivesse começado remédios nessa época, quantas coisas seriam diferentes!
Fiquei então na terapia muito tempo, um pouco melhor até que algum médico me deu remédios, não lembro quem ou quando. Está nos brancos da memória.
Uso antidepressivos há muitos anos já. Não tenho planos de parar. Sei que é uma doença crônica que pode ser controlada.
E porque tanto desânimo?
Claro, que como todas as pessoas, tenho meus momentos baixos, mas no geral, há muitos anos não tenho nenhuma crise de desesperança completa, aquele cinza na alma. Vejo meu estado atual como sequela de tudo que passei ou deixei de fazer.
Essa lembranças de hoje, tirados os filtros do desmerecimento, me dão força. Era pra ter sido décadas atrás, está sendo agora.
Obrigada mãe, pai e todos os outros. Qualquer ´defeito´ ou desentendimento não tem valor nenhum. Agradeço de joelhos a Deus por tê-los na minha vida e fazer parte da vida de vcs. Vou beber nessa fonte do passado para seguir em frente.

#muitoamor

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